sábado, 7 de abril de 2012

A MORTE NÃO SERÁ O FIM



4:13: Não queremos, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais como os outros que não têm esperança.
  
   “...ignorantes...” No grego é “agnoeo”, “não saber”, “ser  ignorante” ou “não compreender”. Muito  provavelmente Paulo escrevia aqui em resposta a perguntas que lhe tinham sido feitas, ou mediante alguma carta, ou oralmente, por intermédio de Timóteo. Os crentes tessalonicenses tinham várias ideias errôneas sobre a natureza e a significação da segunda vinda de Cristo. É até mesmo possível que alguns deles, tal como entre alguns de Corinto, duvidassem da realidade da ressurreição dentre os mortos, embora não pareça ter sido esse o principal problema dos tessalonicenses. Alguns pensavam que a vida em Cristo de alguma maneira dependia da sobrevivência do corpo físico até ao arrebatamento, ou então que alguma ressurreição distante e remota seria dada aos “crentes mortos”, ao passo que os crentes vivos, por ocasião do retorno de Cristo, seriam imediatamente glorificados; e talvez também imaginassem que os crentes mortos receberiam uma espécie de glorificação inferior, em relação à ressurreição dos crentes vivos, como uma menor participação no avanço espiritual representado pela “parousia” ou retorno de Cristo. Para esses, a morte física era um rebaixamento da esperança cristã. O apóstolo dos gentios, entretanto, deita por terra essas ideias errôneas. Tanto os crentes “vivos” quanto os crentes “mortos” compartilharão  igualmente glórias do Senhor Jesus, já que possuem a mesma esperança, ainda que esta venha a cumprir-se no caso deles, de maneira levemente diferente para uns e para outros. Não há que duvidar que o apóstolo Paulo tinha instruído aos crentes tessalonicenses acerca dessa doutrina; mas ainda não tinham tido eles o tempo de absorver corretamente suas instruções, pelo que não possuíam ainda o conhecimento espiritual e mental que deveriam possuir sobre esse aspecto escatológico da experiência da igreja.
  
   “...dormem...” Temos aqui um eufemismo para os crentes que “faleceram”. Trata-se de eufemismo comum em muitas culturas, tanto antigas como modernas, porque, sob um exame superficial, a morte física se assemelha a um sono profundo. Além desta passagem, em seis outros trechos de Paulo figura essa expressão. O Senhor Jesus também empregou esse eufemismo, conforme se vê em João 11:11.
   O verbo “dormir”, usado nas Escrituras, em algumas acerca da natureza da morte física, não tem por intuito ensinar coisa alguma acerca da natureza da morte física. Trata-se de um simples eufemismo para indicar a morte. Por exemplo, não há apoio teológico  algum para a doutrina falsa do “sono da alma”, em existência ativa, após a morte física. (Ver Fil. 1:21,23; II Cor. 5:7). Essa expressão continua sendo usada comumente por pessoas que crêem que a pessoa real sobrevive à morte física, em forma de espírito, dentro de um nível espiritual da existência, mas sempre como eufemismo para indicar a morte física.
   O uso que se faz dessa expressão, nos escritos sagrados, mitiga a gravidade da morte física, mostrando-nos as seguintes verdades. 1. A morte física é inconseqüente; 2. Esse sono é temporário, porquanto haverá o grande despertamento para a vida eterna; 3. Há algo de descanso, até mesmo na morte, já que então o crente cessa de sofrer dores e tribulações, mas entre numa fase serena, como se fosse um sono tranqüilo. Portanto, a morte física não deve ser temida, pois, em última análise, a morte não mata.

   “... os demais que não têm esperança...” Esses são “os de fora”, que ainda não tinham confiado em Cristo, sem nenhuma certeza que a morte física leva o crente a uma existência melhor. Antes, os incrédulos vivem sujeitos ao temor da morte durante toda a existência terrena (ver Heb. 2:15), pelo que também se sentem em triste escravidão. Os tais vivem tão ocupados com a carne que pensam que todo o significado da vida está vinculado à matéria, pelo que também o pensamento da morte remove deles qualquer esperança de bem-estar espiritual.

   “...não têm esperança...” A palavra “...esperança...” pode ser usada “objetiva” ou “subjetivamente”, respectivamente indicando “aquilo que é esperado” e “a disposição da esperança”. O crente exerce uma expectação presente, a esperança por um melhor mundo vindouro, no qual a salvação será levada à “plena concretização”. Desta concretização é que consiste a esperança que temos como uma das virtudes cristãs cardeais. Os incrédulos não têm nem uma coisa e nem outra, embora possam substituí-las por outras coisas. Mas o apóstolo  dos gentios não reconhece aqui qualquer substituto, dando a entender que aquele que não tem Cristo não pode ter autêntica esperança, até que entregue sua vida às mãos de Cristo, que é a grande esperança da humanidade. (Essa ideia pode ser confrontada com a passagem de Efé. 2:12, que declara: “...naquele tempo, estáveis sem Cristo, separados de comunidade de Israel, e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança, e sem Deus no mundo”).
   Como confirmação da declaração de Paulo, neste ponto, consideremos o exemplo seguinte de total ausência de esperança pagã, em um papiro pertencente ao século II D.C. (em Deissman, Light, 164): “Irene, a Taonofre e Filo, bom consolo: Fiquei triste (mesma palavra usada neste texto) e chorei pelo que partiu, ao chorar por Dídimo. Fiz tudo quanto era apropriado, como também Epafrodito, Termutiom, Filiom, Apôlonio e Plantas. Porém, contra tais coisas ninguém pode fazer coisa alguma. Portanto, consolai-vos uns aos outros”.
   Essas palavras podem ser contrastadas com o que disse o apologista cristão, Aristides, que viveu mais ou menos na mesma época: “E se qualquer homem justo dentre eles (entre os cristãos) se vai deste mundo, regozijam-se os crentes e dão graças a Deus; e escoltam o corpo como se ele estivesse sendo transportado de um lugar para outro lugar próximo”. (Pais Antinicenos, IX, 277, Kay).
   “Paulo proíbe a eles (aos crentes tessalonicenses) de se lamentarem como os incrédulos, os quais dão livre vazão à sua tristeza, porquanto consideram a morte como a destruição final, imaginando que tudo quanto é tirado do mundo, parece”. (Calvino, in loc.).
   “Pois podem pôr-se e levantar-se novamente. Quando se põe nossa breve luz, permanece uma noite ininterrupta de sono”. (Catulo).
   “Não faças pouco da morte diante de mim. Prefiro ser na terra servo de outrem, homem de poucas terras e de poucos recursos, do que ser príncipe sobre todos os homens, que se reduzem ao nada”. (Aquiles na Odisséia, de Homero).
   Vários dos filósofos, principalmente Platão, perceberam a grandiosa esperança da vida imortal; mas não vincularam a ela os “meios”. No entanto, o cristianismo liga à esperança da imortalidade os “meios” apropriados, isto é, Cristo Jesus, cuja vida haveremos de compartilhar plenamente.
   
“Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (I Cor. 15:55).